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Antes da automação digital: veja como funcionava o controle de qualidade analógico na era de ouro do vinil
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Antes da automação digital: veja como funcionava o controle de qualidade analógico na era de ouro do vinil

Publicado em 13 de outubro de 2025 às 12:21

3 min de leitura

Em 2025, algoritmos modernos detectam defeitos em produtos industriais em milissegundos. Sistemas automatizados analisam milhões de pontos de dados, identificam anomalias microscópicas e rejeitam unidades defeituosas sem intervenção humana. Mas em 1965, na maior fábrica de discos do mundo, a tecnologia mais sofisticada disponível eram ouvidos humanos treinados.

A fotografia que é a capa deste post mostra uma profissional de controle de qualidade da EMI sentada diante de pilhas de discos de vinil, fones de ouvido ajustados, concentrada em detectar imperfeições que poderiam arruinar a experiência de milhões de ouvintes. Sua função: garantir que cada cópia de álbuns como “Rubber Soul” dos Beatles, mas também de Frank Sinatra, Pink Floyd, Cliff Richard e centenas de outros artistas do catálogo EMI, saísse perfeita da linha de produção.

Este era o controle de qualidade antes da era digital. Não havia scanners automatizados, análise espectral computadorizada ou redes neurais. Apenas concentração humana, ouvidos excepcionalmente treinados e um processo meticuloso repetido milhares de vezes por dia.

O gigante industrial de Hayes

A fábrica da EMI em Hayes, oeste de Londres, operava em escala industrial massiva. O complexo ocupava 61 hectares e empregava incríveis 14.000 trabalhadores no auge da produção durante os anos 1960. Ali, a EMI prensava aproximadamente 20 milhões de discos anualmente, atendendo a demanda insaciável da era de ouro do rock e pop britânico.

Cada disco passava por um processo de manufatura complexo: corte do master em laca, eletrodeposição química para criar stampers metálicos, prensagem do vinil sob temperatura e pressão controladas, resfriamento gradual e finalmente aplicação de etiquetas. Em cada etapa, variáveis poderiam introduzir defeitos audíveis que arruinariam o produto final.

Contaminantes microscópicos causavam pops e clicks. Pressão irregular durante a prensagem criava distorções harmônicas. Temperatura inadequada resultava em empenamento. Centragem imperfeita gerava variações de pitch perceptíveis. E ao contrário da manufatura moderna, onde sensores detectam problemas instantaneamente, em 1965 a única forma confiável de identificar esses defeitos era através de audição crítica.

A ciência dos “ouvidos de ouro”

As profissionais de controle de qualidade desenvolviam o que a indústria áudio chama de “golden ears” – ouvidos de ouro. Esta não era uma metáfora romântica, mas uma habilidade técnica específica resultado de anos de treinamento intensivo.

Golden ears significava a capacidade de identificar distorções sutis em bandas específicas do espectro audível, detectar variações de fase que causariam problemas na reprodução estéreo e perceber anomalias que passariam completamente despercebidas por ouvintes comuns. Era o equivalente analógico dos algoritmos de detecção de anomalias que sistemas de IA usam hoje.

O treinamento levava anos. Profissionais precisavam conhecer intimamente como cada tipo de música deveria soar em condições ideais. Jazz exigia atenção especial para preservar a dinâmica e transientes dos metais. Rock demandava verificação cuidadosa da distorção intencional de guitarras versus distorção indesejada do processo de prensagem. Música clássica requeria verificação meticulosa de range dinâmico e ausência de ruído de superfície que comprometeria passagens pianíssimo.

A diversidade do catálogo da EMI exigia versatilidade extraordinária. A profissional precisava alternar mentalmente entre diferentes assinaturas sonoras, ajustar suas expectativas auditivas conforme o gênero e manter concentração crítica mesmo após horas de escuta repetitiva. Era multitarefa cognitiva em nível que hoje associaríamos com profissões como controladores de tráfego aéreo.

O processo de test pressing

Antes de comprometer recursos na prensagem de milhares de cópias, toda gravação passava pela fase crítica de test pressing. Pequenos lotes de 5 a 10 discos eram prensados usando os stampers recém-fabricados. Estas cópias vinham completamente despidas de arte – sem capas, etiquetas decorativas ou elementos gráficos. Eram puramente utilitárias, focadas exclusivamente na avaliação de qualidade sonora.

Os test pressings circulavam entre artistas, produtores, engenheiros de gravação e executivos da gravadora para aprovação final. Mas antes de chegar a essas mãos, passavam pela avaliação rigorosa do departamento de controle de qualidade. Era a última chance de identificar imperfeições, ruído de superfície, distorção harmônica ou outras anomalias antes de iniciar produção em massa.

Fonte: Hardware.com.br

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