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Nasa e vida em Marte: novo round
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Nasa e vida em Marte: novo round

Publicado em 14 de setembro de 2025 às 16:00

4 min de leitura

João Lucas da Silva é doutorando em Ciências Biológicas na Universidade Federal do Pampa. O texto a seguir foi publicado originalmente na Revista Questão de Ciência.

Num ato insano, abri o X, antigo Twitter. Ou terá sido o Instagram? Já não lembro. O fato é que me deparei com um post que capturou a minha atenção: havia uma coletiva de imprensa da Nasa agendada para quarta-feira, 10 de setembro. Fiquei empolgado. Segundo o que pude apurar rapidamente nas redes, a coletiva traria novas informações sobre Marte. Melhor ainda, sobre a melhor bioassinatura, um indício da presença de vida, no passado distante do planeta vermelho. Me soou familiar, mas dei uma chance. Poderia ser algo novo. Spoiler: não era.

A coletiva de imprensa era sobre uma amostra que já havíamos discutido aqui na RQC. Naquela oportunidade, há mais de um ano, o que se sabia era o seguinte: em 25 de julho, a Nasa anunciara que o rover Perseverance havia encontrado em Marte uma rocha potencialmente importante para a busca de vida passada no planeta. A descoberta é empolgante, mas os cientistas ressaltam que ainda não há prova definitiva de atividade biológica. A rocha, apelidada de “Cheyava Falls”, é provavelmente um lamito, um tipo de rocha sedimentar formado por silte e argila. Instrumentos a bordo do robô detectaram moléculas orgânicas na amostra. É importante lembrar que esse tipo de molécula também pode se formar sem qualquer participação de organismos vivos.

Outro aspecto intrigante são as “veias” de sulfato de cálcio presentes na rocha. Elas costumam se formar quando água atravessa fraturas e deixa minerais precipitados, o que sugere que houve água circulando por ali, o que em si não é uma novidade, pois o lugar onde pousou o rover foi escolhido a dedo. No entanto, a presença de olivina, um mineral de origem ígnea, indica que essa água estava em temperaturas mais altas, talvez pouco favoráveis para a vida.

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Além disso, a rocha apresenta bandas avermelhadas que contêm manchas esbranquiçadas cercadas por halos escuros, lembrando pintas de leopardo. Análises químicas apontam a presença de ferro e fosfato nessas regiões. Na Terra, formações desse tipo são frequentemente associadas à atividade de micróbios subterrâneos, que utilizam o ferro oxidado como fonte de energia, de modo semelhante a como nós usamos o oxigênio. Isso torna a descoberta ainda mais interessante para os astrobiólogos.

Apesar de toda essa empolgação, os cientistas foram cautelosos. Reações químicas puramente abióticas, como as causadas por fluidos ácidos, também podem produzir padrões semelhantes. Por isso, é cedo para afirmar que as estruturas observadas são sinais de vida passada. E lamento informar, mas o artigo científico, agora revisado por pares e publicado na Nature, não muda isso. Aliás, citando o próprio artigo:

“Em resumo, nossa análise nos leva a concluir que a Formação Bright Angel contém texturas, características químicas e minerais, e assinaturas orgânicas que merecem ser consideradas como potenciais bioassinaturas” — ou seja, uma característica que é consistente com processos biológicos e que, quando encontrada, desafia o pesquisador a atribuí-la a processos inanimados ou biológicos, compelindo-o a reunir mais dados antes de chegar a uma conclusão sobre a presença ou ausência de vida.

Embora o artigo não seja “a prova definitiva” de microfósseis em Marte, há um aspecto interessante, que no ano passado havia sido usado contra uma interpretação biológica, que é a presença de olivina, como explicado acima. Alguns haviam apontado que a “olivina e o sulfato tenham se tornado parte da rocha devido às temperaturas extremamente altas em Marte, causando uma reação química não biológica que criou as manchas”. O artigo publicado, contudo, enfatiza: “O contexto geológico e a petrografia indicam que essas reações ocorreram em baixas temperaturas”.

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Já na sessão de perguntas, aos 45min:48s, um repórter da CBS News fez o seguinte questionamento, muito pertinente, por sinal. A reprodução pode ser um pouco extensa, mas esclarece muito.

REPÓRTER: “Estou curioso, um dos meus colegas encontrou um vídeo no YouTube de abril que basicamente destacava exatamente essa formação e falava sobre ela como uma possível bioassinatura. Gostaria de saber o que mudou desde então para justificar elevar isso ao nível de uma coletiva de imprensa. Foi simplesmente o processo de revisão por pares seguindo seu curso? Porque parece muito semelhante ao que vocês reportaram na época. Obrigado”.

Quem respondeu ao questionamento foi Joel Hurowitz, que lidera a autoria da pesquisa publicada na Nature:

Fonte: Superinteressante

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