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Para que servem os sonhos?

Publicado em 28 de setembro de 2025 às 12:00

3 min de leitura

O texto abaixo foi publicado originalmente na Revista Questão de Ciência.

Heródoto conta que o rei Xerxes I, líder do Império Aquemênida, invadiu a Grécia no ano 480 AEC com um exército de 1 milhão de homens. Isso dá quase 1% da população mundial na época, motivo pelo qual os historiadores contemporâneos estimam algo mais humilde – entre 100 mil e 150 mil homens.

Após ouvir o conselho, Xerxes – até então decidido a entrar com o pé na porta – voltou atrás e cancelou a invasão. Foi então que um vulto começou a visitá-lo em seus sonhos. Noite após noite, a visão o incitava a ignorar o tio e partir para cima dos gregos. Perturbado, Xerxes pede a Artabano que veja o que ele vê. Recomenda que o tio durma por uma noite em sua cama, com seus trajes, para que tenha seus sonhos. E assim ele faz.

O vulto, é claro, não cai na pegadinha e manda o papo reto para Artabano: “Então exortas Xerxes a não marchar contra a Hélade? Mas nada ganharás, nem no futuro, nem no presente, querendo desviá-lo da decisão do destino!”. Assustado, o tio pula da cama e ordena o ataque. Má ideia: após a épica resistência espartana na Batalha das Termópilas (incorporada à cultura pop pela HQ 300, de Frank Miller), os persas são derrotados em Salamina e Plateia.

Ao longo do livro Histórias – considerada a obra fundadora da historiografia no Ocidente – , o autor grego Heródoto relata esta e outras duas ocasiões em que o destino do povo persa teria sido definido por sonhos e visões noturnas de seus líderes.

Heródoto evidentemente não tinha uma câmera escondida para saber o que se passava no dormitório de Xerxes: seus escritos, como um documentário do Discovery Channel, são repletos de diálogos fictícios e dramatizações. Mas o papel central atribuído aos sonhos em um texto que se propõe documental mostra o quanto eles eram importantes no imaginário da Antiguidade.

Os mais antigos registros escritos escavados por arqueólogos, as inscrições cuneiformes sumérias, já relatam o poder profético atribuído aos sonhos e seu uso para tomar decisões políticas e militares. O Épico (ou Epopeia) de Gilgamesh, texto literário e religioso treze séculos anterior à Era Comum, é repleto de ações motivadas por devaneios noturnos. Sacerdotes egípcios deixaram inúmeros hieróglifos em que tentam dar sentido às visões que os fiéis tinham durante o sono.

Sidarta Gautama se torna Buda após uma sequência de sonhos reveladores. Platão, que propunha uma Atenas governada por um comitê de sábios e acadêmicos, considerou prudente avisar que os sonhos são uma péssima fonte de conselhos para as autoridades. Mais tarde, na raiz da expansão islâmica medieval, Maomé aprovou a interpretação de sonhos como uma forma de se comunicar verdadeiramente com Alá. Enquanto isso, na Europa, Santo Agostinho ficou tão preocupado com seus sonhos eróticos que se desculpou com Deus em seus escritos: o que ele podia fazer se seu cérebro pecava à sua revelia?

O que torna os sonhos uma preocupação universal e tão poderosa? Por que eles parecem premonitórios, e algumas previsões parecem se realizar? O que os psicólogos e neurocientistas descobriram sobre sonhos e a razão deles existirem, e o que eles realmente são capazes de nos contar?

Artabano no Google

Mesmo em uma população urbana contemporânea do Ocidente, uma parcela razoável das pessoas atribui propriedades divinatórias aos devaneios noturnos do cérebro. Em um artigo publicado em 2008, os psicólogos Carey Morewedge e Michael Norton descrevem o seguinte experimento: eles apresentam quatro cenários hipotéticos sobre aeroportos para 182 entrevistados em uma estação de metrô em Boston. Em uma das situações imaginárias, o entrevistado vai pegar um voo no dia seguinte e o governo dos EUA informa que há um risco razoável de ataque terrorista. Em outro, o entrevistado sonha que seu avião caiu. Conclusão: mais pessoas afirmaram que desistiriam da viagem por causa do sonho do que por causa do risco real.

Fonte: Superinteressante

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