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Pequeno por fora, gigante por dentro: Nobel de Química premia cientistas por trás dos cômodos microscópicos
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Pequeno por fora, gigante por dentro: Nobel de Química premia cientistas por trás dos cômodos microscópicos

Publicado em 8 de outubro de 2025 às 18:00

3 min de leitura

O Prêmio Nobel de Química de 2025 foi concedido nesta quarta-feira (8) a Susumu Kitagawa, 74 anos, professor da Universidade de Kyoto (Japão); Richard Robson, 87, da Universidade de Melbourne (Austrália); e Omar M. Yaghi, 60, da Universidade da Califórnia em Berkeley (EUA). Eles irão dividir igualmente a quantia de 11 milhões de coroas suecas (cerca de R$ 6,2 milhões).

O trio é responsável pelo desenvolvimento das metal-organic frameworks, ou MOFs – estruturas metal-orgânicas ultraporosas que funcionam como minúsculas “esponjas atômicas”, capazes de aprisionar e organizar moléculas em escala nanométrica.

O Comitê Nobel comparou o feito a uma cena de Harry Potter: as MOFs seriam como a bolsa de Hermione Granger, que parece pequena por fora, mas guarda um espaço imenso dentro. Por trás dessa analogia divertida, há uma das descobertas mais revolucionárias da química contemporânea: a criação de sólidos com espaços internos controláveis, que podem ser usados para reter gases tóxicos, purificar água, armazenar energia e até extrair água do ar do deserto.

“As MOFs são materiais extremamente versáteis, com grande diversidade estrutural e sintética, e que possuem aplicações capazes de impactar diretamente a vida das pessoas. Por isso, ocupam hoje um papel de destaque em setores estratégicos, tanto no Brasil quanto no cenário global”, afirma Pedro Andrade, professor do Departamento de Física da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), à Super.

Até os anos 1980, os químicos já sabiam montar moléculas complexas, mas criar materiais tridimensionais com poros e canais internos (uma espécie de “cristal com cômodos”) era quase impossível. A química sólida, ou “química do estado sólido”, como descreveu o laureado Roald Hoffmann, era “um deserto sintético”.

Foi nesse contexto que o britânico Richard Robson começou a imaginar se seria possível desenhar sólidos a partir de blocos que se encaixassem como peças de Lego. Em 1989, Robson criou a primeira estrutura do tipo: um cristal feito de cobre e moléculas orgânicas que formava uma rede tridimensional cheia de cavidades microscópicas.

Essas “salas invisíveis” podiam ser preenchidas com pequenas moléculas de solvente – como se, em escala atômica, ele tivesse construído um diamante oco. Isso mostrou que era possível criar um sólido previsível, organizado e poroso.

Poucos anos depois, o japonês Susumu Kitagawa levou o conceito adiante. Ele demonstrou que esses materiais podiam ser estáveis e reutilizáveis, uma vez que absorviam gases como metano e oxigênio e depois os liberavam, sem perder a forma.

Kitagawa percebeu que, dependendo do desenho da estrutura, era possível “abrir” e “fechar” esses espaços internos, como portas que se movem conforme a pressão ou a temperatura. Chamou esses materiais de “cristais porosos flexíveis” e, em 1998, propôs uma classificação das “gerações” de MOFs: a primeira instável, a segunda estável e a terceira dinâmica, capaz de mudar de forma em resposta ao ambiente – um avanço decisivo para consolidar o campo.

Enquanto isso, o jordaniano Omar Yaghi, que cresceu em uma família pobre em Amã e se mudou aos 15 anos para os Estados Unidos, estava fascinado pela ideia de construir sólidos “programáveis”. Em 1999, ele criou a MOF-5, feito de zinco e moléculas orgânicas, considerado o modelo mais icônico do campo.

Era um material resistente ao calor, com poros permanentes e altamente organizados, que não se deformava mesmo depois de todos os solventes evaporarem. A MOF-5 inaugurou o conceito de “química reticular” – o design racional de sólidos a partir de blocos moleculares modulares, como se fossem vigas e pilares em uma construção atômica.

“Uma analogia simples é pensar em um prédio sem paredes nem tetos: as vigas e colunas corresponderiam aos compostos orgânicos (chamados de ligantes), enquanto os metais atuariam como os ‘nós’ da estrutura, localizados nas junções dessas vigas e colunas. O resultado é uma rede altamente organizada, que se mantém ‘de pé’ mesmo contendo inúmeros espaços vazios – como uma pequena esponja com inúmeros poros, capazes de absorver compostos variados, como poluentes, gases, água e fármacos”, explica Andrade.

Fonte: Superinteressante

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